ps: agradeço em especial à Chico's Bar Editoras Confederandas pelo espaço.
Quando percorre o tempo à procura de sua alma, ou coisa parecida em essência, geralmente encontra tempo, mas a alma não encontra. Isso porque cala no tempo a alma que tanto procura.
Na idade de Zeus, fora intercalando seu ar com o mundo, seu mundo e o ar. Sócrates disse-lhe sempre para calar esse mundo, sempre deixar fluir a alma. Mas ele não deixava passar o mundo; os sons que o aguçavam, que tocavam por algum lugar que desconhecia.
Sentava-se na Ágora, era tardezinha. No discurso de um encontrava fé, no de outro palavras apenas. Assitia às mulheres em suas casas, e seus filhos, e suas lutas de espadas espartanas. E os escravos carregando daqui, e dali, e suas lutas com espadas atenienses, parisienses talvez. E os homens discutindo suas fés, ornando um homem ideal. Os homens cantavam-nas, e lutavam com suas espadas, e eram menos espartanas ou atenienses. Em meio ao tempo aquela gente parecia tanto a gente dos outros tempos.
Platão o chamara de lado. Não era seu costume, mas ele não compreendia aquele homem que se sentava tardezinha na Ágora. Ele era tão diferente deles, tão pouca fé demonstrava, mas se sentava na Ágora e ouvia, e o poente do Sol o penetrava. Parecia-lhe tão próximo de sua juventude.
Ouvira a falta da alma, em palavras calmas, pouco logos. Tentou então explicar seu mundo, e apesar de não ser o mundo de ambos, eram próximos.
Descobriu Platão sobre Cristo, sobre a Lua, e o Sol. Encantou-se com a grandeza da humanidade que ele ajudara a moldar, e por vezes se perguntou se aquilo poderia ser verdade. Mas o que era a verdade? Intangível, por certo. Como então duvidar daquele moço que lhe falava em revoluções além mar, rosas de Hiroshima e meninos de pele vermelha? Como negar-lhe a existência da relatividade, paraconsistência, inconsistência da vida cotidiana do século XXI?
Sim, chegou-se ao XXI, e antes dele o dezoito, dezesseis, o quinze... e todos eles recheados de histórias inspiradas por deusas diversas, ou homens diversos, e belos. E por muitos dias conversaram sobre estes homens e seus feitos, até dar-se por satisfeito o homem de ombros largos. Estava, de fato, extasiado. O logos viera de alguém tão desapegado ao discurso, e embora as imagens não se concretizassem em sua mente de forma clara ela sabia que aquele rapaz não mentira. Se postou ante seu mundo e o mundo que viria a ser e, eureka, insurgiu-lhe uma vontade de viajar entre os camponeses franceses e os cientistas ingleses, seja lá o que franceses e ingleses quisessem dizer. O que quer que fosse América, seus arranhas-céu de concreto ou a imensidão de várias Hélades, tudo lhe remetia a uma ordem que ansiava. Parecia mesmo uma criança – a dor dos nossos não lhe era possível.
Mas e daí, pensou o moço, a dor destas pessoas tampouco nos é possível, com nossos livros e livros, discursos e poemas, e canções. Fizera bem ao deixar Platão entrever o futuro? Ele lembrou-se de que este tipo de questão deixara de lhe importar a algum tempo. E a conversa fora uma boa conversa. Ele realmente esboçara um sorriso ao ouvir idzak newton, e perguntou-se se seu velho professor de grego ficaria satisfeito por aquela tentativa de transmutação de um belo dzeta num vulgar z – tinha a certeza de que a satisfação passaria longe do mestre, mas alegrou-se em imaginar a situação. Além do mais, nem sempre houve a possibilidade de constatar-se o quão era a vida alternativa de Sócrates segundo seu mais proeminente discípulo. E como eram belas as gregas confidenciadas por Platão, e os gregos.
A realidade era que ele se ambientava mais e mais ao Sol ameno, e o cheiro de mar que lhe tocava a face, e divagava para omitir de si este detalhe, sem sucesso. Por mais que ainda parecesse um estranho, fora ofertado a ele um manto, e sua presença na Ágora já não espantava. E aquelas pessoas cada vez mais lhe eram familiares. Convidou-se várias vezes para ficar, mas sabia no fundo que não podia...